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VB 2009 Foto: PM

quinta-feira, 21 de março de 2024

quinta-feira, 5 de junho de 2014

Tem quilombo na Amazônia
Patrícia Marinho de Carvalho


INTRODUÇÃO
TEM QUILOMBO NA AMAZÔNIA é um texto adaptado do relatório do diagnóstico arqueológico (setembro/2010) realizado na área ao longo da Linha de Transmissão de Energia Elétrica no arquipélago de Marajó, sob a coordenação da empresa A Lasca Arqueologia. Dá ênfase ao patrimônio histórico, cultural e paisagístico registrado durante a expedição realizada pelas arqueólogas Julia Berra e Patrícia Marinho de Carvalho nos municípios de Afuá, Chaves, Anajás, Breves e Salvaterra.
Nesse contexto, uma de nossas preocupações foi à identificação de possíveis comunidades remanescentes de quilombos em municípios atendidos pelo “Linhão”, como é conhecida pelos marajoaras a futura Linha de Transmissão da Ilha.
A PRIMEIRA PARTE, “Tem quilombo na Amazônia”, está dividida em dois subitens, o primeiro, “Os negros Marajoaras e seus quilombos: passado e presente”, trata da introdução da mão-de-obra escrava na Amazônia durante o período colonial, destacando a situação do então Grão-Pará e sua distribuição e história de luta na ilha de Marajó, e quais são as feições dessa presença negra na ilha nos dias atuais. O item seguinte, “Arqueologia da diáspora africana e a cultura material marajoara” traz uma reflexão sobre a contribuição que os estudos da Arqueologia da Diáspora podem trazer para a ampliação do conhecimento sobre presença negra na ilha; nesse item é também apresentado um breve panorama da cultura material produzida pela população marajoara, a fim de oferecer os aportes iniciais para futuros estudos etnoarqueológicos, que ajudem a compreender o complexo, mestiço e fascinante universo cultural marajoara, e assim, dar uma melhor resposta aos futuros impactos provocados pela instalação e funcionamento da rede de energia.
Na SEGUNDA PARTE são relatados os demais aspectos históricos e patrimoniais de cada município, bem como de seu patrimônio natural, sendo apresentados de acordo com a ordem da expedição: Afuá, Chaves, Anajás, Breves e Salvaterra.


PRIMEIRA PARTE – Tem quilombo na Amazônia

a)      Os negros marajoaras e seus quilombos: passado e presente
Tal qual se observa em outras regiões brasileiras onde a escravidão do negro africano se fez presente, a Amazônia não passou incólume por esse processo e da mesma forma também traz em sua história episódios de rebelião contra a escravidão expressa na formação de mocambos e quilombos de negros fugitivos. E muitos dos descendentes desses negros aquilombados ainda podem ser contatados vivendo em comunidades remanescentes de quilombos, ou vivendo com suas famílias por toda região.
Não apenas a escravidão indígena foi relevante nessa região da Amazônia, como faz pensar a escassez bibliográfica sobre o tema, cabendo aos estudos regionais, maior dedicação ao tema. Essa escassez derivaria do interesse historiográfico pelos ciclos econômicos, e como destaca Gomes (2005, p.44) “em termos de escravidão para a Amazônia a presença africana teria tido pouco significado econômico”.
A história da presença do negro na Amazônia segue os passos da ampliação do território lusitano nas Américas, cuja conquista da região é selada com a fundação de Belém em 1616, marcada pelas guerras contra os estrangeiros – ingleses, franceses, holandeses e irlandeses – que tentavam ocupar a região (SALLES, 1971, p.3).
Para tanto foi introduzida a lavoura, tendo a mão-de-obra indígena escravizada à principal fonte de trabalho no primeiro momento e mais tarde somou-se a essa, a força de trabalho advinda da escravaria africana, que além dos interesses econômicos próprios do tráfico negreiro, sabe-se dos conflitos entre colonos e jesuítas pela posse dos indígenas e das dificuldades em sua escravização, por fugas para o interior da floresta que esses conheciam bem, e alta mortandade dos povos indígenas que configuraram um verdadeiro massacre, sobretudo com a intensificação das “descidas”, as expedições de captura de indígenas.
O lento desenvolvimento da agricultura devido à escolha de produtos impróprios ao clima da região fazia da escravidão negra um negócio pouco lucrativo. Associado a isso o incentivo ao extrativismo (“drogas do sertão”) tornou-se relevante e nesta atividade o negro não se adaptou tão bem quanto o indígena. A escravidão no norte não alcançou o mesmo volume que em outras regiões do Brasil.
De acordo com a documentação disponível – que é inexistente para alguns períodos – entre 1755 e 1820, (funcionamento da Companhia Geral de Comércio do Grão-Pará e Maranhão), a região amazônica recebeu mais de 50 mil escravos (SALLES, 1971, p.51).
Antes dos portugueses, já os ingleses no século XVI haviam introduzido mão-de-obra escrava em suas feitorias no Macapá. No século XVII é porta de entrada dos negros africanos era o Maranhão, o que foi motivo de conflitos entre esse estado e o Pará, já que o Maranhão fazia uma partilha desigual dos negros, que primeiro lá desembarcavam (SALLES, 1971).
A entrada de escravos no Grão-Pará sempre foi modesta. A criação da Companhia significou um impulso no comércio escravo. Porém não se restringiu ao período em que ela funcionou, assim como antes já havia a escravidão, com o seu fechamento o comércio escravo também continuou, haja vista as muitas vias de entrada de escravos africanos na região.
Parte desse contingente de escravos era encaminhado para a “Ilha Grande de Joanes”, como foi batizada pelo colonizador a atual Ilha do Marajó, como consta em cópia de documento fornecido por Raimundo Carmo de Souza Chagas, conhecido por Piska, Secretário de turismo esporte e lazer de Afuá, intitulado “A cidade de Afuá”, que faz referência ao “folheto: A Antiga produção e exportação do Pará”, de autoria de Manuel Barata. Este documento informa que em 1665 a Ilha Grande de Joanes “foi criada capitania e concedida em donatário de juro e herdade pelo rei Dn. Alfonso ao seu secretário de Estado, Antônio de Sousa Macêdo, por carta de doação de 23 de dezembro de 1665 (Arquivo da Torre do Tombo, ‘Chancelaria’, doações de Dn. Afonso VI., f. 74 v. O donatário tomou posse dela por seu procurador, em 2 de setembro de 1667”. Mais tarde Antônio Macêdo foi titulado “Barão da Ilha de Joanes”.
Porém, existe a suposição que já em 1498 um navegador português Duarte Pacheco Pereira havia feito contato com os habitantes da ilha (Nheengaíbas e Aruãs), e em 1499, consta o relato do espanhol que navegou o Amazonas Francisco Yañes Pinzon.
O fato é que a presença negra na Ilha do Marajó acompanha a conquista do colonizador, que por sua vez é protagonista de uma história de devastação das populações indígenas que por lá viviam, seja pelas doenças trazidas com o homem branco, seja pela escravidão a que foram submetidos ou pela guerra pelo território.
Na história conta que em 1659 o Padre Antonio Viera negociou um acordo de paz com as lideranças indígenas da ilha, porém esse acordo não foi respeitado pelos colonizadores e a escravidão do indígena continuou maciçamente.
Já em 1703 teve início a criação de gado, que mais tarde ganhará grandes proporções (Souza, 2007).
A criação de gado foi introduzida na área de campos (a ilha pode ser dividida entre duas regiões: campos e de florestas), e conforme Pacheco, na historiografia sobre o Pará, os campos são descritos como sendo habitados por negros, e as florestas pelos indígenas. Porém, para entender a distribuição do contingente de negros pela ilha essa visão é limitadora, pois não da conta dos processos de mobilidade interna e externa, tantos dos habitantes da ilha, quanto de outras cidades, como Macapá, Belém e até mesmo a Guiana Francesa. Além do que é necessário considerar as fugas dos escravos negros e a formação de quilombos entre os séculos XVII e XIX para compreender (Pacheco, 2010, p.39-40).
Essa visão que localiza a presença negra na Ilha na região dos campos pode advir da divisão social do trabalho, que apesar de negros e indígenas serem destinados a todos os tipos de atividades, era mais recorrente o escravo negro ser posto na lida com o gado no campo, enquanto o escravo indígena era direcionado para a agricultura[1]
Sobre os estudos da presença negra na Ilha de Marajó, após Nunes Pereira (primeiro etnólogo a se dedicar sobre o tema) surgiram novas pesquisas, muitas tendo como objetivo “a busca de elementos configuradores de povos africanos em diásporas: falares, dançares, performances, cantorias, crenças, religiosidades, saberes e costumes, têm emergido em grandes expressões e mesclas culturais” (Pacheco, 2010).
Ao citar os relatos históricos sobre a presença negra na Ilha no século XVII, Pacheco afirma que em localidades como Breves, Anajás e Afuá, entre outras, diferentemente do que divulgado pela historiografia, são áreas de “mestiçagem e recorrentes contatos culturais”, com a presença de “vilas de populações de cor”, a comunidade remanescente de Gurupá (Anajás), ou as “famílias negras habitantes de espaços urbanos e rurais nestes municípios de florestas”. (Pacheco, 2004, p. 41).
O quadro abaixo procura ilustrar essa presença negra na ilha com dados do ano de 1823:


Município
Habitantes
Escravos
Livres não-identificados
Brancos
% de escravos
Muaná
3.524
503
3021
-
14,27
Cachoeira do Arari
3.463
531
2902
130
15,33
Chaves
1.853
447
1362
44
24,12
Salvaterra
497
31
296 índios
124 mestiços
46
6,23
Soure
366
155
44 índios
141 mestiços
26
42,60
Melgaço
5.719
1.140
1.440 índios
2.118 mestiços
1.021
19,93
Breves
227
80
147
-
35,24
Monsarás
857
249
190 índios
130 mestiços
200 não identificados
88
29,05
Quadro 2: Adaptado a partir de dados apresentados no artigo de Agenor Sarraf Pacheco “As Áfricas nos Marajós: visões, fugas e redes de contatos”.

Note-se que Monsarás foi um município até 1894, que hoje é um distrito de Salvaterra, local de maior concentração de remanescentes de quilombo na Ilha do Marajó, e o que hoje se denomina remanescente de quilombo, não necessariamente é o antigo quilombo dos tempos coloniais, no meio da floresta, mas pode se tratar de um local próximo ao antigo quilombo, ou uma formação posterior a supressão da escravatura.
Desde o início da mão-de-obra escrava as fugas faziam parte do cotidiano em todas as partes onde houve escravidão. No Pará a partir da primeira metade do século XIX com a inauguração da imprensa paraense, as fugas de escravos são divulgadas por anúncios mandados publicar pelos senhores descrevendo o “fujão”. Outra fonte de informação sobre esse ato de rebeldia está relacionada em relatórios e diversas leis e decretos com medidas para conter a fuga ou para desbaratar mocambos e quilombos, comuns desde o século XVIII.
A rota de fuga dos negros e índios tomava muitas direções, tendo a floresta, mas não só, como um refúgio quase que natural por sua densa camuflagem. Também os furos e igarapés e a sazonalidade de cheias e vazantes dificultavam o acesso das milícias e capitães do mato. Como em relatório de 1858 descrevendo a situação e as medidas para desbaratar, entre outros, o quilombo nas cabeceiras do rio Anajás em Muaná (Salles, 1971, p. 216).
Vários historiadores citam o documento oficial pedindo providencia em 1787 quando a esse quilombo de Anajás e de outros no rio Macacos, no atual município de Breves e também no município de Chaves. Já no Soure a rota de fuga era o rio Arauari, eu contava com diversos mocambos compostos por negros, índios e soldados desertores (Pacheco, 2010, p.55), somente para citar os municípios foco dessa expedição de diagnóstico.
A fuga extrapolava os limites da ilha, tanto para os escravos de Marajó que podiam fugir para outro estado, sobretudo Macapá, quanto para escravos de outros estados que procuravam refúgio na ilha e em outras localidades do Pará, que provocou grande movimentação de negros na região.
Também deve ser observada a recorrente presença indígena ao lado de negros nos mocambos e quilombos, dois grupos explorados, que se encontrava em uma mesma situação de servidão em busca da liberdade. Essa relação influenciou profundamente a cultura do povo marajoara: “em torno de saberes para curar a si mesmo e ao gado, como murrinhas dos bezerros, Nunes Pereira deixou ver, ‘rezas e ervas miraculosas que o índio revelava ao negro. Compartilhavam ainda fumos, bebidas produzidas de mandioca, altamente fermentada, que resguardavam valores, significações sociais e mágico-religiosas” (Pacheco, 2010, p. 50 apud Pereira, 1952)
Sobre essas trocas um exemplo é a pajelança cabocla que possui “uma visão de mundo em que se mesclam concepções de fundo indígena (especialmente dos antigos Tupinambás), católicas, kardecistas e umbandistas” (Maués, 2008).
Sobre as trocas culturais o padre jesuíta João Daniel relata que quando fizeram contato com os índios pacajás, esses, diferentemente dos os grupos entrados no Brasil, usavam saias e calções, não por ser um costume ancestral, “mas porque fugindo do Maranhão, uns escravos, foram parar nas cabeceiras deste rio Pacajá, e deles aprenderam os índios este bom costume” (Pacheco, 2004, p. 41 apud Daniel, 2004, p. 372).
Além do tráfico de escravos e das consequentes fugas, outro fator que contribuiu para a movimentação dos negros e formação de quilombos e mocambos na ilha foi a Cabanagem, revolta popular que aconteceu entre os anos de 1835-1840 e repercutiu amplamente no estado do Pará, sobretudo na ilha de Marajó, onde estava um importante foco da revolta.
De acordo com Salles (1971, p.260), a Cabanagem foi um movimento representativo da “última etapa de um processo revolucionário que se iniciou antes – bem antes – da Independência (a adesão do Pará à Independência ocorreu a 15 de agosto de 1823) e explodiu doze anos depois, em 1835”.
Negros e indígenas juntaram-se aos desertores do exército vislumbrando na revolta popular uma possibilidade de liberdade. A participação efetiva do negro é levantada por Salles que pesquisou a documentação da época, e afirma que a revolta começou nas zonas de plantação de cana, locais de maior tensão social, incluindo a região de Muaná e daí estendendo-se por todo o arquipélago do Marajó.  De fato, hoje, conversando com os moradores mais velhos de Marajó, muitos fazem referências aos “antigos cabanos”, do terror que fazia com que as pessoas fugissem pra dentro das matas.
Ainda, segundo Salles, essa participação dos negros na cabanagem preocupou as autoridades que baixaram medidas proibindo o “ajuntamento de escravos possuídos de idéias partidárias”, e mesmo entre os próprios líderes cabanos que não estavam de acordo com os ideais abolicionistas, como Eduardo Angelim que mandou “fuzilar dois dos principais líderes dos escravos: Joaquim Antônio e Patriota” e ao final Cabanagem, os negros em busca da liberdade multiplicaram o número de quilombos e mocambos na Amazônia (Salles, 1971, p.266-71).

Toda essa movimentação de negros durante o período da escravidão na Ilha do Marajó hoje é representada pela existência de várias comunidades remanescentes de quilombos ou inúmeras famílias isoladas e afrodescendentes compondo a população marajoara.
Em nossa expedição identificamos algumas famílias e membros de comunidades remanescentes de quilombo. No município de Chaves, de acordo com o secretário da administração municipal, Ademir Gemaque, existem pelo menos duas comunidades remanescentes, porém ainda não foram tituladas: comunidade Nascimento e comunidade do Cururu.
Já no município de Anajás conhecemos a comunidade do Igarapé do Peixe Boi (Coord. UTM 0661590/9888392), que faz divisa com o município de Muaná, onde há um grande contingente de afrodescendentes e de acordo com o chefe de Gabinete da Prefeitura Marcus Jardim, a comunidade recebe uma verba do MEC (Ministério da Educação e Cultura), por ser tratar de comunidade remanescente de quilombo, mesmo ainda não reconhecida pelo INCRA. Também em Anajás, outra comunidade chamada Mocambo do Guajará, como o nome já indica, seria uma comunidade remanescente que também não foi ainda reconhecida. Outra comunidade citado por Marcus Jardim como possível remanescente chama-se Barro Preto, localizado no Alto Anajás. Na comunidade Cá-te-espera, um afrodescendente, o Sr. José Ladeira, 74 anos, filho de português, disse que nasceu no Igarapé do Jataí, e conta que lá haviam muitos negros fugidos da escravidão, informação confirmada pelo Sr. Melquiades, também nascido em Jataí. (Imagens 1).





Imagem 1: José Ladeira e Raimundo

Também nessa região, na comunidade Monte Sinai, Dona Doralina Fiúza da Silva, 56, que é afrodescendente conta que nasceu no Igarapé Chiqueiro, e que seus pais e bisavós também nasceram na região. Uma das moradoras mais idosas de Monte Sinai é Dona Erendina, que tem mais de 90 anos, nasceu em Muaná e conta que o pai morreu com 117 anos (Imagens 2 e 3). Nessa comunidade fomos informados que na boca do Pequaquara existem muitos negros, que comprovamos no dia seguinte quanto navegamos por esse rio.




Imagem 2: Dona Doralina Fiúza
Imagem 3: Dona Erendina Figueiredo da Silva

Em Anajás, próximo a comunidade , também visitamos uma família de afrodescendentes, cuja matriarca, Dona Margarida (Imagem 4), conta que nasceu em Cachoeira do Arari e veio pra cá a mais de 30 anos com os filhos pequenos e o marido Manoel Lalú do Nascimento, há 13 anos. Ela e os filhos são proprietários de uma extensa faixa de terra chamada propriedade São Vicente.
Depois seguimos para a região do Aterro Grande, conhecido por seus tesos, local onde mora um dos filhos de Dona Margarida, o Sr. Manoel Gomes do Nascimento, 58 (Imagem 5). Ele vive no Igarapé Pequaquara, na margem direita do rio Anajás. É um local de difícil acesso e nessa época normalmente só chegamos caminhando pelo meio da mata, porém a chuva dos últimos dias possibilitou que depois de 2 horas levados por um rabudo (embarcação própria navegar em rios estreitos e repletos de plantas aquáticas) alcançássemos a casa de Manoel navegando pelo esplêndido rio Pequaquara.
Sr. Manoel contou que seu avô que chamava Manoel Gomes de Araújo morreu com 94 anos dizia que a mãe dele havia sido escrava. Disse também que no município de Cachoeira do Arari, local onde ele e seus pais nasceram, há um grande número de afrodescendentes. Mais tarde pudemos confirmar essa informação por meio de conversa com a professora Rosa Acevedo, que fez o Laudo Antropológico dos remanescentes de quilombo dos municípios de Salvaterra e Cachoeira do Arari.
Segundo Manoel em Cachoeira tem uma localidade chamada Choque, que tem esse nome porque antigamente existia muito puraque (peixe-elétrico), e que tem muitos negros que vivem lá. Além de Cachoeira, ele diz que Santa Cruz do Arari e Ponta de Pedra também são municípios onde tem maior concentração de negros.




Imagem 4: Dona Margarida (camisa Rosa) sua filha Madalena (camisa verde) suas netas e bisnetos
Imagem 5: Sr. Manoel, a esposa e a neta



No município de Salvaterra encontramos a maior concentração de comunidades de afrodescendentes do arquipélago. Inclusive há no município um movimento organizado, representado pela Malungu (Coordenação das Associações das Comunidades Remanescentes de Quilombos do Pará). Nessa oportunidade pudemos conversar com Luzia Betânia, a Beth Quilombola que faz parte da coordenação estadual da Malungu.
Segundo Beth as comunidades com as quais a Malungu fez contato são as seguintes:
Município
Comunidade
PONTA DE PEDRAS
Tartarugueiro
Santa Ana
CACHOEIRA DO ARARI
Gurupá (certificada)
SALVATERRA (Ramal 1)
Caldeirão
Boa Vista
Paixão
Rosário
Vila União (Campinas)
Rosário
Siricari
Deus Ajude
Providência
Salvá
Mangueiras
Salvaterra (Ramal 2)
Pau Furado
São Benedito
Santa Luzia
Bairro Alto
Quadro 1: Relação das atuais comunidades remanescentes de quilombo de Salvaterra de acordo com Beth da Malungu;

Os quilombolas de Salvaterra estão organizados procurando a regularização de suas terras, porém até o momento apenas uma comunidade é certificada que é Gurupá, região citada como escolhida pelos escravos fugitivos de Soure para formação de mocambos e quilombos (Pacheco, 2010, p.54).
A questão da titulação das terras é a maior preocupação das comunidades dado os conflitos com os fazendeiros da região, que segundo a liderança vem historicamente invadindo a área ocupada pelos remanescentes, provocando muitos problemas para as famílias, que muitas vezes são impedidas de plantarem suas roças, são cercados por cercas elétricas e muitas vezes têm suas plantações destruídas pelos búfalos dos fazendeiros. A proibição de circular impossibilita a comunicação entre os povoados que são interligados.
Além de impedir a comunicação entre os remanescentes pela proibição de circulação, muitas vezes o quilombola vê sua sobrevivência ameaçada, já que além da agricultura, as comunidades têm uma economia fundada na a pesca e na coleta, ou seja, a terra é fundamental para a sua subsistência.
Porém as comunidades seguem lutando por seus direitos, realizando oficinas de conscientização e mobilização, solicitam audiências públicas e em 2006 foi publicada a cartilha “Quilombolas da ilha de Marajó – Pará”, desenvolvida no âmbito do Projeto Nova Cartografia Social da Amazônia, que tem por objetivo elaborar o auto-mapeamento de comunidades tradicionais da Amazônia e foi elaborado em conjunto com a comunidade de Salvaterra, segue abaixo o mapa do território quilombola de Salvaterra:






Mapa 1: Território Quilombola.
Fonte: Projeto Nova cartografia social da Amazônia; Série: Movimentos sociais, identidade coletiva e conflitos; Fascículo 7: Quilombos da ilha de Marajó – Pará; 2006

Analisando esse mapa verificamos que o traçado proposto para a Linha de Transmissão de Energia Elétrica percorrera a área do Território Quilombola, e como alertado pela Beth da Malungu, é possível que sejam atingidas áreas de cultivo, que são fonte de subsistência dessas comunidades remanescentes de quilombo.
Dessa forma, levando-se em consideração a grande distribuição de afrodescendentes pela ilha do Marajó, e a pouca informação que se tem sobre as comunidades remanescentes, sugerimos que um estudo mais detalhado seja realizado, para garantir a preservação de remanescentes de quilombo que consistem em importante patrimônio histórico cultural brasileiro, bem como garantir que a implantação da Linha de Transmissão não ameace sua existência.

b)     A arqueologia da diáspora africana e a cultura material marajoara
As pesquisas arqueológicas que enfocam a presença africana partindo da perspectiva dos estudos da diáspora são relativamente recentes no Brasil.
Os estudos da diáspora basicamente estão fundamentados na ideologia de que africanos e seus descendentes que se espalharam por todo o mundo durante o período em que perdurou o tráfico de escravos negros, sobretudo no continente americano, compartilham de elementos comuns, que podem ser observados na pratica cotidiana, e que foram transmitidos oralmente de geração para geração.
Os primeiros teóricos da diáspora africana eram afro-americanos, sendo W.E.B. DuBois considerado o Fundador desses estudos com a publicação de The Supression of the Slave Trade to the United States, já em 1896 (Heywood, 2008).
Já na arqueologia as pesquisas da cultura material de influência africana no Brasil, tendo como base a perspectiva dos estudos da diáspora são relativamente recentes, e igualmente tem sua origem nos Estados Unidos, onde os primeiros estudos datam da década de 1960, ganhando impulso na década de 1990, com o advento da Arqueologia Pós-processualista.
A Arqueologia pode oferecer novos dados sobre a presença africana no Brasil e seus desdobramentos na formação cultural do povo brasileiro, haja vista que além de apoiar-se em documentação histórica (muitas vezes poucos esclarecedores sobre aspectos culturais desses povos africanos), trabalha com o registro material dessa presença.
Além da produção material do passado, a produção material do presente e a relação que os grupos humanos estabelecem com o meio, são elementos para a interpretação arqueológica. Uma investigação de cunho etnoarqueológico que contemplasse populações pretéritas a fim de compreender como negros, indígenas e brancos cunharam um modo de vida diferenciado nos campos e florestas do arquipélago, será necessário para qualquer plano que tenha por objetivo conter, contornar ou amenizar o impacto ambiental provocado pela implantação da Linha de Transmissão de Energia.
Um estudo mais aprofundado da arqueologia da Ilha de Marajó, que abranja, além do seu potencial pré-histórico que desde a década 1950 tem recebido a atenção dos arqueólogos, também abranja seu potencial histórico, ajudaria a responder algumas perguntas como: a produção material ribeirinha foi de alguma maneira afetada pela abundante cerâmica pretérita espalhada por toda região? De que forma os africanos e seus descendentes influenciaram e/ou foram influenciados por essa cultura pretérita e pela produção material e modo de vida dos indígenas que habitavam a ilha?
Dessa forma, apresentamos um pequeno relato sobre tal produção material.
Além do extrativismo e da pesca há em toda ilha a produção de farinha de mandioca em suas variadas versões. Em Afuá, navegando pelo rio Araramã, após ter visitado a Vila Tessalônica (Imagem 6), comunidade ribeirinha construída em cima de um cemitério indígena, na qual ainda é possível avistar o material arqueológico (Imagem) aflorando nas margens que estão desbarrancando, também está à casa de farinha da Dona Dalila Lima dos Santos que fica na comunidade São Pedro (Imagens 7-10).




Imagem 6: Vila Tessalônica








Imagens 7-10: Casa de farinha; forno para torrar a farinha, prensa de mandioca e peneira;



Na casa de farinha de Dona Dalila havia um forno pra torrar mandioca feito de cobre com aproximadamente 2,5m de diâmetro, que segundo ela, seu marido havia adquirido a mais de 30 anos, das mãos de um senhor que já não era seu primeiro dono. Além do forno, havia a prensa de mandioca fabricada com troncos de árvore e as peneiras de farinhas feitas por Dona Dalila.
No igarapé Saparará, onde existe um importante sítio cerâmico da fase marajoara (SCHANN, 2003), como atesta o senhor Bena, dono da propriedade onde foram feitos estudos arqueológicos, encontramos várias mulheres que se dedicavam a fabricação de farinhas, entre elas as irmãs do Sr. Bena, Dona Adelina e Maria da Graça, porém não tivemos oportunidade de conhecer a caça de farinha, pois a chuva pontual da Amazônia nos fez adaptar o percurso.
Na casa de Maria da Graça, que tem um pote cerâmico incrustado em seu jardim, também registramos muitos utensílios feitos por elas, como o fogão de barro, vários itens de cestaria, inclusive as peneiras de farinha (Imagens 12-15).








Imagem 12-15: As irmãs Adelina e Maria da Graça da esquerda para a direita; o fogão de barro de Maria da Graça; a cestaria variada e peneiras e vassoura de palha.


Em Afuá conhecemos a ceramista dona Algemira (Imagem 16-17), disse que nasceu nas proximidades do rio Araramã, e que aprendeu a fazer a cerâmica com sua mãe. Dona Algemira que tem mais de 60 anos, disse que não faz mais cerâmica por problemas de saúde; nas fotos abaixo ela demonstra como é feita a impermeabilização:








Imagem 16-17: Dona Algemira e sua cerâmica


Na boca do rio Cururu em Anajás conhecemos Dona Luzia, outra ceramista que também já não se dedica mais ao ofício. Ela também utilizava o mesmo processo de impermeabilização usando a resina da árvore chamada “jataicica”.




Imagem 18-19: Dona Algemira e sua cerâmica



Em Chaves, no Igarapé Bacuri, encontramos mais uma ceramista, a Dona Domingas que tem 82 anos, mas deixou de fabricar cerâmica há muitos anos atrás. Segundo ela havia mais duas ceramistas na comunidade que também pararam de fabricar cerâmicas há muitos anos.
O entendimento da produção material marajoara proporcionará maiores informações sobre a diáspora negra na ilha, o modo de vida dos ribeirinhos, suas formas de subsistência e também poderá ajudar a entender se as populações do passado, por meio dos artefatos cerâmicos abundantes na ilha influenciaram de alguma maneira a produção material dos marajoaras do presente.


SEGUNDA PARTE – Municípios visitados


Mapa 2: Expedição de Diagnóstico – Ilha do Marajó
Ponto 1 - Furo do Lípio (entrada da comunidade de Araramã) - UTM 573424 / 9961894
Ponto 2 - Rio Araramã ou rio Chaparucú - UTM 577774 / 9965076
Ponto 3 - Comunidade Tessalônica - UTM 580979 / 9960804
Ponto 4 - Produção de palmito - UTM 577810 / 9964818
Ponto 5 – Cemitério - UTM 575390 / 9963402
Ponto 6 - Dona Algemira (ceramista) - UTM 567307 / 9969800
Ponto 7- Porto de Afuá - UTM 567520 / 9982548
Ponto 8 - São Joaquim - divisa entre Afuá e Chaves - UTM 594226 / 9985374
Ponto 9 - Porto de Chaves - UTM 631037 / 9978188
Ponto 10 - Retiro Menino de Deus (Chaves – Bacuri) - UTM 630249 / 9977152
Ponto 11 - Sítio arq. Menino de Deus (Chaves – Bacuri) - UTM 630278 / 9977164
Ponto 12 - Sítio arq. Árvore caída (Chaves – Bacuri) - UTM 630820 / 9977550
Ponto 13 - Entrada da comunidade São José Charapucú - UTM 590239 / 9976656
Ponto 14 - Sitio da comunidade Bacuri (sítio do riacho) - UTM 591538 / 9977922
Ponto 15 - Parada no rio Sutambique (foto 4 mulheres e 3 criancinhas)- UTM 582007 / 9943278
Ponto 16 - Rio Sutambique - UTM 585144 / 9934046
Ponto 17 - Boca do rio Cururu – comunidade Galiléia -UTM 594690 / 9926356
Ponto 18 - Comunidade Cá-te-espera - UTM 638923 / 9890754
Ponto 19 - Igarapé Saparará - UTM 654105 / 9878096
Ponto 20 - Casa Sr. Miguel dos Reis (afrodescendente de Guajará) - UTM 646786 / 9882822
Ponto 21 - Casa Sr. Manuel (rio Pequaquara – Aterro Grande) - UTM 660665 / 9900418
Ponto 22 - Comunidade Monte Sinai (Peixe Boi) - UTM 661590 / 9888392
Ponto 23 – Salvaterra - UTM 776958 / 9916406



Afuá
O primeiro município do arquipélago visitado nesta expedição foi Afuá, na porção norte - ocidental da Ilha de Marajó, banhado pela baía do Viera Grande, no braço sul do rio Amazonas. Faz limite “ao norte com a Ilha Caviana, ao nordeste com o município de Chaves, ao sul com os municípios de Anajás e Breves, ao sudeste com o município de Anajás, ao sudoeste com os municípios de Breves e Gurupá leste com o município de Chaves e a oeste e noroeste com o Estado do Amapá. Coordenadas geográficas 00º 09’ 04” de Latitude Sul e 50º 23’ 15” de Longitude Oeste de Gr.[2].
            O município tem uma população de 32.633 habitantes[3] de acordo com os números do IBGE.
Também de acordo com as informações do documento (ANEXO) fornecido pelo secretário de Esporte Cultura e Lazer do Município de Afuá, Raimundo Carlos de Souza Chagas, o Piska, o município de Afuá, segundo consta no “folheto” intitulado “A antiga produção e exploração do Pará”, de autoria de Manuel Barata, Afuá teria se originado a partir da fixação na região da Sra. Micaela Arcanjo Ferreira, “antes de 1845”. As terras das quais a Sra. Micaela se apossou passaram a chamar sítio Santo Antonio.




Imagem 20: Vista aérea da cidade de Afuá. Fonte: prefeitura de Afuá

Por sua localização estratégica para porto, logo se formou um povoado em torno da Igreja Nossa Senhora da Conceição (Imagem 21), que começou a ser construída em 1870, que quatro anos mais tarde foi elevada a condição de freguesia.
Ainda de acordo com o documento de Manuel Barata, em 28 de novembro de 1980 foi criada a comarca de Afuá, e em 1896 ela passou a ser cidade e mais tarde município.



Foto: fornecida pelo secretário Piska

Foto: Paty Marinho (set/2010)
Imagem 21: Igreja Nossa Senhora da Conceição: passado e presente.

Afuá: patrimônios natural, cultural e histórico
O município está a cinco horas de barco da cidade de Macapá, no Amapá, com a qual mantém intensas relações econômicas e sociais. Sobretudo durante o mês de julho quando acontece o “Festival do Camarão” (Imagens 21-24) , quando além de visitantes de Macapá, paraenses de outras localidades vem se divertir com essa festa tradicional de Afuá, que caminha para sua 29ª. edição.




Imagens 22-24:
O “Festival do Camarão



Foto: fornecida pelo secretário Piska



Durante os três dias de Festival, Afuá chega a receber mais de 30 mil pessoas, caracterizando o maior ingresso de divisas advindo do turismo, para essa que é divulgada por seus moradores como a “Veneza Marajoara”, já que está suspensa sob o arquipélago do Marajó. Assim, caminhando pelas passarelas de concreto, ou de madeira (que são seu charme) o visitante pode apreciar a arquitetura das casas, construídas quase todas de madeira e sob palafitas, pois no período das chuvas (janeiro a junho) os igarapés enchem d’água (Imagens 29-30), caracterizando o clima típico do bioma amazônico, com uma estação chuvosa, o inverso que vai de janeiro a junho, e o inverno, que é a estação seca, que se estende pelos meses de julho até dezembro.


Foto: Paty Marinho (set/2010)

Foto: Paty Marinho (set/2010)


Foto: Paty Marinho (set/2010)





Foto: Prefeitura
Imagens 25-28: Afuá



Foto: Prefeitura


Foto: Prefeitura
Imagens 29-30: Afuá na época das chuvas

Em Afuá não transitam automóveis ou motos, apenas bicicletas e demais veículos não-motorizados como as Bici-táxi (Imagens 31-32), invenção de um morador da cidade, o Seu Sarito, que consiste em duas bicicletas adaptadas que permitem o transporte de quatro pessoas ou mais.


Foto: Prefeitura

Foto: Paty Marinho (set/2010)
Imagens 31-32: O Bici-táxi além de ecológico é símbolo da cultura afuense


Afuá é marcada pela sazonalidade, pois além desse alagamento anual, a cada quatro anos, religiosamente, a cidade é atingida por uma enchente (Imagens 33-34):


Foto: Prefeitura



Foto: Prefeitura
Imagem 33-34: Afuá alagada

O centro de Afuá constitui-se em um belíssimo patrimônio cultural paisagístico. A cidade suspensa por palafitas, bastante bem conservada é exposição do conhecimento regional de excelentes carpinteiros, cuja técnica no uso da madeira na arquitetura, pode ser admirada num passeio pelas ruas do município (Imagens 35-38).







Fotos: Paty Marinho (set/2010)
Image35-38: Os exímios os carpinteiros da Ilha do Marajó



A “Veneza Marajoara” não se resume no colorido centro da cidade. Navegando pelos rios, igarapés e furos temos acesso às muitas comunidades ribeirinhas espalhadas por todo o município. No trajeto é possível ver pequenas comunidades à margem dos rios, como também casas isoladas que vão compondo um cenário impressionantemente belo (Imagens 39-42).





Parque do Charapucu

Rio Araramã

Rio Araramã
Imagens 38-42: Rios de Afuá




Afuá também tem diversas ilhas de exuberante beleza natural como a ilha da Queimada, dos Porcos, Caldeira e a ilha dos Camaleões na onde se desenvolve o projeto “Quelônios da Amazônia, desenvolvido pelo IBAMA, que visa à reprodução de tartarugas e tracajás





Imagens 43-44: Tartaruga e tracajás – Projeto Quelônios



Chaves
            Onde hoje é o município de Chaves já foi uma aldeia de índios Aruãs, e segundo conta o Secretário da Administração Municipal Ademir Gemaque Pinho, até pouco tempo atrás era possível encontrar fragmentos cerâmicos dos antigos habitantes da região, porém com o avanço das águas da baía do Viera Grande, que arrastou boa parte da terra firme, já não são mais encontrados com tanta facilidade.
Os Capuchos da Província de Santo Antônio fundaram uma missão para catequizar os aruãs e em 1757 o aldeamento foi elevado à categoria de Vila, tornando-se o um centro militar até final do século XVIII. Esse caráter militar da Vila levou a um fato importante em sua história foi um “ato de adesão”, quando da proclamação da República por D. Pedro I.[4]
No ano de 1889 foi criada a comarca de Chaves e depois de dois anos foi elevada a categoria de cidade.

Chaves patrimônios natural, cultural e histórico
O passado militar de Chaves abre as portas da cidade. Assim que se cruza um lindo e extenso trapiche branco e vermelho ao desembarcar em águas atlânticas é possível avistar os canhões bem em frente a um dos bem conservados prédios públicos (Imagens 45-48).



Foto: Paty Marinho (set/2010)

Foto: Paty Marinho (set/2010)

Foto: Paty Marinho (set/2010)

Foto: Paty Marinho (set/2010)
Imagens 45-48: Município de Chaves

As ilhas Caviana e Mexiana pertencem ao município de Chaves, e constituem-se num belo patrimônio natural do município. É nessa região das ilhas que se dá o encontro das águas do Atlântico com o Amazonas, fenômeno conhecido por “pororoca”.
Ao navegar pela Baía do Vieira Grande de um lado temos as ilhas do outro uma exuberante e longa praia (Imagens 49-51).

Ilha Mexiana

Praia de Chaves

Baía do Viera
Imagens 49-51: Município de Chaves


Anajás
            Anajás recebeu esse nome, pois de acordo com os registros do IBGE no período colonial viviam no oeste da ilha o grupo indígena que deu o nome ao município, que nos primórdios era chamada Mocoões, nome de um rio da região.
A história administrativa de Anajás e extensa, talvez por sua posição central pertenceu ora a um município, ora a outro. Primeiramente fazia parte do município de Chaves, e depois de Breves, até o ano de 1869, quando se tornou freguesia,e também por várias vezes deixou de sê-lo. Em 1886 foi criado o município de Anajás.

Anajás: patrimônios natural, cultural e histórico
            De patrimônio histórico, só mesmo restou às fotos, de acordo com o chefe de Gabinete da Prefeitura de Anajás, Marcus Jardim, na década passada todos os prédios antigos foram tombados, dando lugar a novos prédios que abrigam os órgãos públicos (Imagens 52-54).

Foto: Prefeitura (Marcus Jardim)
Imagem da antiga igreja de Anajás. Atualmente a igreja passa por uma nova reforma.

Foto: Prefeitura (Marcus Jardim)

Foto: Prefeitura (Marcus Jardim)
Imagens: 52-54: Prédios que foram destruídos na década passada.

O município que perdeu do muito do seu patrimônio histórico arquitetônico, tem um patrimônio natural exuberante. Em nossa expedição só pudemos registrar uma pequena parcela desse patrimônio. Abaixo algumas imagens feitas nos rios e igarapés:






Imagens 55-56: Rio Anajás





Imagens 57-58: Igarapé Sutambique










Imagens 59-60: rio Pequaquara


           
Breves
“A capital das ilhas”, assim é conhecido o município de Breves, o maior e mais populoso da Ilha do Marajó.
Conforme divulgado na página oficial do município na Internet[5], a cidade se originou de uma concessão feitas aos irmãos portugueses “Manuel Breves Fernandes e Angelo Fernandes Breves” no ano de 1738. A família Breves construiu o engenho chamado Santana e consolidando o patrimônio da família.
Após a morte de Manuel e Angelo, não foi reconhecida a posse das terras a irmã herdeira e em 1850 a localidade foi elevada a condição de Freguesia. Após esse episódio, a história de Breves é marcada por resoluções e leis que alternaram sua denominação territorial, para em 1909 “a Lei estadual no. 1.122 concedeu em caráter definitivo o foro de cidade à sede municipal, Atualmente o município é constituído pela sede municipal e os distritos de: Antônio Lemos, Cururu e São Miguel dos Macacos”.

Breves: patrimônios natural, cultural e histórico
Breves é a maior cidade da Ilha, o centro urbano é bastante desenvolvido graças ao “investimento gerado pelas madeireiras”. Logo na chegada da cidade, ainda no barco podemos observar o movimento de pessoas e mercadorias. Breves é uma das principais ligações entre Belém e outros municípios da ilha, redistribuindo a mercadoria que vem da capital, e também a que sai da ilha (Imagens 59-60)
Os prédios públicos são bem conservados (Imagens 60-61) e ainda existem muitos prédios antigos como aponta a professora Dione (2009), “o primeiro Mercado Municipal de Breves funcionava no prédio onde atualmente funciona o Banpará”.
Os rios Parauahu e Mapuá, o furo dos Macacos e também os estreitos de Breves, além das diversas ilhas são considerados patrimônio natural devido à beleza paisagística.






Imagens 59-60: Porto de Breves







Imagens 61-62: Igreja (construída em 1942)







Imagens 63-64: Prédio da prefeitura


Salvaterra
Famosa por suas praias de água doce Salvaterra é ao lado de Soure o município mais turístico da Ilha. Habitada pelos índios sacacas foi onde aportou o navegador português aportou Vicente Yañez Pinzon.
“Em 1757, o Governador e Capitão-General Francisco Xavier de Mendonça Furtado, elevou à categoria de Vila, com a denominação de Soure, uma antiga aldeia dos índios Maruanazes. Nas sessões de maio 1833, do Conselho do Governo da Província, extinguiu o território de Soure, que foi anexado ao da vila de Monsarás, tendo este sua autonomia municipal novamente estabelecida pela Lei nº 138, de 9 de novembro de 1847. Com a extinção do município de Monsarás pela Lei nº 652, de 12 de junho de 1894, o território de Soure foi aumentado com grande parte daquele Município. Salvaterra era um povoado de Soure e foi elevado à vila através da Lei nº 758, de 27 de fevereiro de 1901 e instalado por Decreto nº 993, de 9 de abril do mês seguinte. Porém, na divisão territorial fixada pelo Decreto-Lei nº 4.505, de 30 de dezembro de 1943, estabelecida para o período 1944-48, Salvaterra já aparece como distrito de Soure. Durante muitos anos, Salvaterra permaneceu incorporado ao território de Soure. Em 29 de dezembro de 1961, através da Lei nº 2.460, esse município foi criado com área desmembrada de Soure, durante o governo de Aurélio do Carmo. O seu território constituiu-se pelas terras dos distritos de Salvaterra (sede), Condeixa, Joanes, Jubim e Monsarás, que permanecem até hoje”

Salvaterra: patrimônios natural, cultural e histórico
Salvaterra foi um município colonizado pelos frades, quando a sede do município era em Monsarás.  A localidade foi a porta de entrada dos portugueses na ilha, que como citamos acima no documento fornecido pelo secretário Piska chamava-se Ilha Grande de Joanes. Hoje Joanes é uma localidade de Salvaterra onde está a Igreja Nossa Senhora do Rosário, a padroeira da Ilha do Marajó. É possível observar nas paredes as pedras que foram usadas na construção da primeira igreja no século XVII (Imagem 65-66).





Imagens 65-66: Igreja Nossa Senhora do Rosário

Também em Monsarás é possível ver entre as pedras de praia, – um espécie de muro de contensão – o que deveria ter sido um túnel no passado. Os moradores da cidade costumam dizer que era uma rota de fuga em caso de atraque de estrangeiros. Coincidência ou não a samaumeira é uma das árvores mais altas da Amazônia, e muitas lendas tem a árvore como protagonista (Imagem 67-70).









Imagens 67-70: Túnel entre as pedras e a “grande samaumeira”



Histórico em Monsarás é o poço também construído de pedras:


Imagens 71-72: Poço histórico

No belo centro de Salvaterra, na praça Magalhães Barata as margens do rio Paracauarí, que separa Salvaterra do município de Soure está a Igreja Nossa Senhora da Conceição, a padroeira do município, foi construída em 1811:


Imagens 73: Igreja Nossa Senhora do Rosário

Ao lado da Igreja, na praça frequentemente acontecem apresentação de carimbó, dança típica do Pará. E em nossa expedição pudemos acompanhar um pouco dessa beleza, pena que sem as dançarinas com suas coloridas e vistosas saias.



Imagens 74: Grupo de Carimbó de Salvaterra



Bibliografia
GOMES, Flavio. A Hidra e os pântanos. Mocambos, Quilombos e Comunidades de Fugitivos no Brasil (Séculos XVII-XIX). São Paulo, UNESP, 2005
HEYWOOD, Linda M. A Diáspora negra no Brasil. São Paulo, Ed. Contexto, 2008
MAUÉS, Raymundo Heraldo. A pajelança cabocla como ritual de cura xamâmica”. In: Pajelanças e religiões africanas na Amazônia. Raymundo Heraldo Maués e Gisela Macambira Villacorta (org.), Ed. Da UFPA, Belém, 2008
PACHECO, Agenor Sarraf. As Áfricas nos Marajós. Visões, fugas e redes de contato. In Muito Além dos Campos. Arqueologia e história na Amazônia Marajoara. (Denise Pahl Schann e Cristiane Pires Martins (org.), GL Noronha, Belém, 2010
SALLES, Vicente, O negro no Pará. Fundação Getúlio Vargas e Universidade Federal do Para, 1971
SCHANN, Denise Pahl. Evidências para a permanência da cultura marajoara à época do contato europeu. São Paulo, Revista de Arqueologia no. 12-13, 2003
SOUZA, Armando Lírio de. “Evolução do sistema agrário da mesorregião do Marajó: uma perspectiva sócio-histórica”. In: III Congresso Brasileiro de Sistemas e I Congresso Catarinense de Sistemas, 2007, Florianópolis. III Congresso Brasileiro de Sistemas e I Congresso Catarinense de Sistemas, 2007. Capturado em 22/09/2010 http://www.isssbrasil.usp.br/pdfs2/tcms_4.pdf








[1] Para melhor compreender essa questão seria necessário consultar um dos diversos trabalhos que tratam da temática, entre eles a dissertação de mestrado de Eliane Cristina Lopes Soares “Roceiros e vaqueiros na ilha grande de Joanes no período colonial” UFPA, 2002